No Piauí nasceram bons poetas ditos populares, os que compõem poesia com o hábito do povo, com a fala do povo, as crendices do povo, os heróis do povo. O cordel, ensinança de sociologia, vale exemplo desse tipo de concepção poética. Popular se dizem também os versos sertanejos, os desafios nas feiras, as cantigas de amor. O nosso José Manuel de Freitas fez poemas simples, em que elogia a vida boa do leite mugido, da rede gostosa, cheirosa e convidativa. Clodoaldo Freitas andou escrevendo sobre as nossas frutas maravilhosas, que já se vão sumindo hoje na voragem da industrialização. Hermínio Castelo Branco reproduziu na LIRA SERTENEJA cenas vivas dos vaqueiros, das vacas amocambadas, do eleitor de cabresto, das farinhadas inesquecíveis. Teodoro Castelo Branco passou à história da literatura brasileira piauiense na qualidade de POETA CAÇADOR, pois fez das peripécias das caçadas o motivo mais puro do seu lirismo caboclo. O desfile desses inspirados poetas não termina neste ponto. Outros de igual porte se acrescentam: José Coriolano, Raimundo de Areia Leão, o médico, o menestrel João Ferry, para falar na defuntaria saudosa.
Extensa a galeria: Zé do Pano, Zé Pretinho, Antônio Francisco dos Santos (Cão Dentro), José Fernandes de Carvalho (Zé da Prata), João Ventura, Domingos Fonseca, João Soeiro - que não sei se já foram desta para pior, cantadores, violeiros, improvisadores, gente do martelo, encheram de alegria os sertões sem fim e encantaram muita cabocha safada, das que gostam sobretudo de motorista de caminhão e soldado de policia.
O Piauí possui realmente autênticos cultores de poesia popular, a que brota da maravilhosa inspiração das cousas simples e das tradições coletivas. Entre os vivos está o divino telúrico Hermes Vieira, que J. Miguel de Matos caracterizou como a maior expressão da poesia folclórica da terra piauiense, versátil e fecundo.
Publicou-se agora NORDESTE, poemas de Hermes, uma iniciativa aplaudida de José Bruno dos Santos da Companhia Editora do Piauí.
Este NORDESTE mostra o poeta, em toda a grandeza dos versos que as criações do povo inspiram, abrangendo aspectos da vida e da natureza, psicologia das gentes, bichos, episódios amorosos e trágicos, alimentos, cerimônias, amores escondidos, mitos, lendas, superstições, doenças, músicas, danças, facécias, anedotas, linguajar - e ninguém melhor do que Hermes Vieira colocou esses processos de vida de homens e mulheres humildes na construção de versos que constituem exemplo de arte verdadeira e motivo de consagrada inteligência.
A Tito Filho, 23/07/1988, Jornal O Dia.
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