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sexta-feira, 26 de novembro de 2010

JULGAMENTO

No "Jornal de Brasília", edição de 14 de outubro de 1988, Aluízio Napoleão publicou este seguro comentário, com o título CARTAS QUE SÃO FARPAS:

Acabo de receber o livro do professor Acrísio Torres, intitulado Cátedra e Política, que reúne cartas escritas durante o regime autoritário, que combateu, revelando seu espírito de oposição ao que julgou prejudicial ao País durante aquela fase difícil da vida brasileira. O gênero foi adotado por Ramalho Ortigão, embora em estilo diferente, num outro país, o Portugal de sua época, ao qual nem o Imperador do Brasil, D. Pedro II, escapou.

As farpas do professor Acrísio Torres são diretas, exteriorizando, sem rebuços, seu pensamento e sua opinião sobre um regime que detestava. Há momentos, porém, em que sua pena, refletidamente, passa a critica alta, ganha em força e persuasão, como, por exemplo, ao dizer, com penetração e, sobretudo, com razão: "O progresso social consiste, sobretudo, no desenvolvimento da inteligência. Isso não se dá neste país de jovens. E se falta esse desenvolvimento da inteligência, não se terá o apuro dos sentimentos altruísticos, únicos que permitem a cordialidade, a solidariedade entre os homens. E se falta o desenvolvimento da inteligência, circunstancia ideal das ditaduras, faltará interesse maior pelo bem-estar comum, e pior, morrerá pouco a pouco até o horror às injustiças, às iniqüidades".

Em outro trecho, o autor mostra-se um pedagogo, ao expor seu pensamento com transparência: "Há natural vocação dos jovens para a politica, mas como realizar essa vocação pelas vias normais, as dos partidos, dominados, estes, pelos velhos sobas, de mentalidade retrógrada? Essa circunstância, decorrente de estruturas arcaicas, continua a impedir o liame entre a formação política dos jovens, papel da universidade, e a participação deles no processo político nacional. Nesse elementar raciocínio, natural a ilação de que a participação política dos jovens deverá implicar alternativas capazes de unir interesses e aspirações dos jovens aos reclamos maiores da nacionalidade".

João Emílio Falcão, em magistral prefácio, disse bem o que deveria ser dito sobre Cátedra e Política: "A sua atuação contra os governos militares, quer na UnB, que nas cartas, lembra a lenda de Selma Lagerlof sobre a ave que asperge a água em grande incêndio de grande floresta. Não lhe importava o resultado, mas a consciência de haver cumprido o seu dever".


A. Tito Filho, 25/10/1988, Jornal O Dia.

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