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quarta-feira, 2 de março de 2011

ACADEMIAS

Deixemos de lado outras academias que nasceram e não floresceram na antiguidade dos tempos. Façamos referencia a Academia Francesa, criada pelo cardeal Richelieu, com as suas quarenta poltronas, e que se tornou modelo de quantas se foram fundando com os mesmos objetivos e vaidades. Cheguemos ao Brasil. Aqui, na segunda capital do país, nos últimos tempos do século passado, a fina flor dos literatos residentes no Rio, deliberou estabelecer uma sociedade de defesa da língua e desenvolvimento cultural, denominada Academia Brasileira, depois conhecida como Academia Brasileira de Letras, cuja primeira presidência muito valorizou o grêmio, pois confiada a Machado de Assis. Antes dela os cearenses, sempre espertos, puseram em funcionamento a Academia Cearense de Letras, que desapareceu e anos mais tarde reapareceu.

A Academia Brasileira frutificou em academias estaduais. Cada unidade da Federação foi instituindo a sua, com o aproveitamento da prata da casa. Nelas se congregavam os principais homens e mulheres dedicados à vida literária ou expressões eloqüentes dos diversos ramos do saber humano, na medicina, na engenharia, no direito, no magistério. Esses clubes gozavam do apreço e da consideração do poder público e da coletividade, que delas recebiam cooperação freqüente nos assuntos culturais.

Passavam-se os anos e as entidades acadêmicas mais se prestigiavam e os seus membros se projetavam na admiração e no respeito geral. De uns vinte anos e esta parte, porém, a excessiva vaidade humana iniciou o processo de parir academias, grêmios e sociedades literárias por tudo quanto biboca haja neste Brasil de asnices internas, dívidas externas e besteiras permanentes. Existem academias de letras por todos os lugares, clubes de poesias, agremiações de oratória, ateneus, institutos, com os seus quadros de sócios nos quais figuram os mais variados tipos: analfabetos, alfabetizados, débeis mentais. Da acima do meio da canela a quantidade de sócios, sócios beneméritos, sócios honorários e correspondentes. Outro dia fundaram a Academia Pindurassaiense de Letras ou mais esclarecidamente a Academia de Letras do Arraial de Pindura Saia, nos confins do Mato Grosso do Sul.

Chegaria a época mais triste de quantas arapucas se vão criando: a fase dos negócios rendosos. O ingresso da pretensa sumidade literária custa dinheiro, com dinheiro se cobra pelo diploma respectivo. Já estão distribuindo títulos de sócio benemérito, honorário e correspondente cada um de preço especial. A produção livresca estarrece. Há hoje nessa vastidão brasileira uma subliteratura que rebaixa o país a níveis da imbecilidade. Fabricam-se poesias por toneladas. Abundam poetas, críticas, contistas. O grande Marcuse dizia que três forças dominavam a sociedade: a econômica, a política, a de inteligência. Pois esta última está na moda: ser ESCRITOR dá prestígio, portas abertas, importância. Leio em jornal do sul que um subúrbio de Uberaba em Minas, chamado Pau Fincado, fundou a Academia de Letras dos Marginais. Talvez seja um respeitável centro das atividades do país.


A. Tito Filho, 29/06/1988, Jornal O Dia

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