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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

VIAGEM

Joaquim Nogueira Paranaguá exerceu os mandatos de deputado e senador do Piauí. Muito lutou pela mudança da capital da República para o Planalto Central Brasileiro. Esteve à frente do governo piauiense quase três meses, como substituto eventual, em 1890, quando deu substancial contribuição para as obras do Teatro 4 de Setembro de Teresina.

Em 1892, esse conterrâneo ilustre deixou o Rio de Janeiro, capital do país, em busca dos seus pagos no Sul desta terra dita de Mafrense. Resolveu viajar pelo interior brasileiro, quando normalmente políticos e estudantes iam em busca da cidade grande e voltavam aos penates em navios mercantes até São Luís e daí viajavam para Teresina por terra, de cavalo, ou de trem de ferro.

As impressões de Paranaguá foram reunidas em livro em 1905. Faz poucos anos fiz segunda edição, que agora reli. Não perdeu a graça e a vivacidade. Para mim, tem significação especialíssima, pois na mocidade percorri esses compridos caminhos, com alguma diferença de roteiro, mas de cenários maravilhosos.

Extenso o percurso vivido e descrito nas páginas do livro. Vário o meio de transporte. Comboio ferroviário, barca, navio tipo gaiola, cavalo. Andança muitas: Estado do Rio, Minas, Bahia. Do longo roteiro, das dificuldades encontradas e vencidas, da boa bóia, da hospitalidade interiorana, das maravilhosas vistas resultou a narrativa sincera, cuja leitura entusiasma na recordação de um tempo de belezas espirituais, convivência amiga, diferente destes dias que correm, violentos e aflitivos, como se o fim do mundo se aproximasse.

Médico, político, parlamentar, educador, homem de ciência, caráter reto, hábitos severos, Paranaguá exerceu o jornalismo e cultivou as boas letras, do que dão testemunho e reportagem e o estilo leve do viajador, numa obra que convocava os brasileiros para os recursos nacionais riquíssimos e perdidos na vastidão nacional.

Desfilam no trabalho aspectos históricos e sociais, costumes comunitários, quadros naturais, comércio e indústria, riquezas minerais, bichos, aves, plantas, transportes. Muitos temas, páginas de ensinamentos, lições da vida. E mais a harmonia de idéias com o que estas representam, pela beleza, característica do modo de sentir, pela decência, que consubstancia o fundo da intenção. Em todo o modo claro de dizer e de convencer.

Joaquim Nogueira Paranaguá doou-se aos semelhantes em benefícios sem conta. Disse dele o filho Correntino Nogueira Paranaguá: "Sua presença continua e continuará a existir como um farol de altruísmo, perseverança e honradez, enquanto houver memória de sua personalidade, simultaneamente forte e suave, combativa e conciliadora, equânime na prosperidade como na adversidade, digno e simples nos elevados cargos que ocupou no meio do povo humilde que viu e chorou o seu encontro com a eternidade".

Retrato bem feito.

Leiam o livro de Joaquim Nogueira Paranaguá. Páginas agradáveis, saborosas, mostrando um Brasil pobre mas feliz, um Brasil que foi convivência leal, o que ele nunca mais será. A máquina gerou a perdição.   


A. Tito Filho, 09/07/1988, Jornal O Dia.

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