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terça-feira, 3 de agosto de 2010

JOÃO ADÉLIA (III)

Rocha Furtado estava eleito governador do Piauí. Eleição a 19 de janeiro de 1947, nos princípios de fevereiro se evidenciava maioria decisiva de votos. Fui com meu pai a Barras, os dois nascidos na terrinha modesta. O velho gostava de furupa e logo convidou D. Chiquinha, do coro da igreja, e integrantes da banda de música local para que compusessem uma espécie de hino em homenagem ao novo governante do Piauí. Foi quando revi João Adélia e o seu inseparável contrabaixo de metal brilhante, que continuava na sagrada memória de herói dos meus dias meninis. Ainda em forma de herói do velho bombardão, e bom de pinga.

Passaram os anos. Na década de setenta, tempo governamental de Dirceu Arcoverde, houve a feira dos municípios no Centro de Convenções de Teresina e arredores. Barracas e representações das comunidades do interior, muitas, cada qual vendendo os seus artesanatos e as gulodices preparadas por mãos de fadas. Belíssima confraternização. Freqüentei a barraca de Barras. Lingüiça gostosa. Meninas bonitas no atendimento da freguesia. Presença da banda de musica dos meus pagos de infância buliçosa e alegre. João Adélia presente, na costumeira postura com o bombardão, arrancando sonoridades abafadas, que ele conseguia no forte sopro bochechudo e nos dedos ágeis nas três teclas do instrumento. Era de ver e aplaudir a banda que ele agora comandava, garbosa, de farda cinza. Dei-lhe abração amigo. Na década de oitenta, na simpática cidadezinha de mesmo nome. Para animação dos festejos se contratou a banda de música de Barras, sob a regência competente de João Adélia. E ele lá, rente, dando vida às rezas, aos leiloes, nos forrós quentes de caboclas e cablocos de dança acochada, desavergonhados. Sempre eu passava o dia de meu natalício na santa paz das novenas e leilões. Quando João Adélia sabia de minha presença nas barraquinhas, entoava a saudação musical ao aniversariante e havia palmas. O tocador ganhava do meu oferecimento uma caixa de cerveja que bebia com os colegas da famosa bandinha de Barras.

Faz três anos abracei João Adélia, meu ídolo de infância, pela última vez. Depois eu conto.


A. Tito Filho, 24/05/1989, Jornal O Dia. 

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