Leio que a biblioteca Cromwell de Carvalho encontra-se em deplorável situação, habitada de baratas, traças e cupins. Sedia-se no antigo Grupo Escolar Abdias Neves, cedido depois à Faculdade de Direito do Piauí.
Anísio Brito, historiador de pulso e sério, servidor público honesto, criou o conjunto cultural composto de biblioteca, arquivo e museu. Organizou-se com aplausos da comunidade. Dava gosto freqüentá-lo, no edifício-sede que Leônidas Melo construiu, na esquina de Coelho Rodrigues com Rui Barbosa, e que receberia o nome de Casa de Anísio Brito. Tudo sob cuidados permanentes. Conservação exemplar. Limpeza. Higiene. Servidores competentes a serviço do público. Estudantes e mais estudantes faziam proveitosa leitura de livros de assunto vário, sobretudo literatura nacional. Diretores ilustres honraram as relevantes funções que o governo lhes atribuía. Com o correr dos anos, a politicalha deu inicio ao entupimento dos cargos com apadrinhados relapsos. A Casa Anísio Brito passou a arquivo. Biblioteca e museu passaram a ocupar outros prédios e nunca mais voltaram ao antigo esplendor do centro de pesquisas, de observações e de leitura. Sinal dos tempos. Poucos se preocupam com assuntos culturais. A sociedade empresarial dos nossos dias preocupa-se apenas com o ganho da dinheirama a qualquer custo, com o luxo exorbitante, o conforto desmedido, o orgulho, a vaidade dos tolos. Explora os trabalhos dos pequenos, paga-lhes migalhas, e cada dia liquida os valores espirituais, provocando o ódio e violência dos órfãos da vida. As bibliotecas, os arquivos e os museus não geram cédulas nem juros exorbitantes. Constituem velharias. A vida social não precisa de inteligências cultivadas, sim de apetites para a esperteza, a exploração e os lucros descabidos. Não há necessidade do estudo, porque o saber faz que os homens se conscientizem dos direitos e deveres, e os homens assim conscientes são perigosos aos que repudiam a construção de uma sociedade justa e decente.
Para que bibliotecas? Melhor que as traças, as baratas e os cupins as destruam, antes que elas ensinem que se destruam as tranqüilidades e os gozos perniciosos de uma ordem social baseada no dinheiro mal ganho.
A. Tito Filho, 11/08/1989, Jornal O Dia.
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