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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

COMUNISTAS - III

Meu pai, José de Arimathéa Tito, nomeado juiz pelo presidente da República para ouvir os presos acusados de comunistas em Teresina, cumpriu os seus relevantes encargos. Não desempenhou qualquer função julgadora, ficando adstrito às normas constitucionais. O juiz comissionado, escreveu o jurista Ribas Carneiro, possuía atribuições muito simples, mecânicas mesmo: receber o comunicado das prisões efetuadas, com os motivos determinados, mandar as declarações dos detidos, instruindo de tudo o presidente da República, para que este elabore mensagem à Câmara dos Deputados, com os esclarecimentos dos atos praticados. Não tem função judicante, mas atribuições registradoras. Nada aprecia. Cabe-lhe presidir as declarações dos detidos com serenidade e critério. Faz o juiz comissionado papel de ouvidor constitucional dos presos, para que estes, em frente do magistrado, sem temores, garantidos e confiantes, dessem resposta as acusações governamentais.

Arimathéa Tito cercou os detidos da mais ampla liberdade e segurança. Escreveu o depoimento de cada um com a maior clareza e perfeita fidelidade.

Rejeitou a atitude dos covardes, autores de denúncias anônimas, por cartas, em que se apontavam atividades comunistas de alguns cidadãos. Em nota à imprensa, convidou os denunciantes a que comparecessem em juízo a fim de que firmassem a competente responsabilidade. Ninguém apareceu. Os covardes agem só às escondidas, perversos e vingativos.

Todos os atos do juiz tiveram ampla publicidade nos dois jornais de comprovada circulação no Piauí: "O Tempo" e o "Diário Oficial".

Meu pai desempenhou o mandato de que o investiu o presidente da República, sob unânime indicação do Tribunal de Justiça, com lisura e honradez.

Ao final, encaminhou os três volumes do processo, a 7 de fevereiro de 1936, ao governador Leônidas Melo, executor das medidas do estado de sítio no Piauí.

O julgamento coube ao Tribunal de Segurança Nacional, colegiado de exceção, de que era membro um ilustrado piauiense, homem de grande cultura, o ministro Pedro Borges da Silva.

Os acusados de comunismo no Piauí, cidadãos humildes e dedicados ao trabalho, foram quase todos condenados a penas de reclusão, cumpridas na velha e derribada penitenciaria de Teresina.

Tempos horríveis, funestos, tristes, em que ao menos se permitia a leitura de livros como O CAPITAL, de Marx, um dos monumentos universais de sabedoria politica.


A. Tito Filho, 28/09/1988, Jornal O Dia

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